quarta-feira, 16 de março de 2011

Sob-lentes: mínimo ensaio incidental sobre ações fotográficas
Igor Rossoni

Os olhos, atônitos, adiantam-se diante dessas fotos. Ora estrelam, outras emudecem. Entanto, o exercício do focá-las enlaça ­ – em si –­ o de olhar e imagens reveladas. Tudo vai além de exatidão de maquinaria e respiro. O coração decanta enquanto dedos tateiam disposição  elementar. Olhares, em instações involuntárias, buscam aconchego no à frente  e – num só atino – eternizam a mobilidade. Deste modo, o registro é mais que impregnação de volumes e tonalidades: é algo limítrofe, precisão entre ser e desejar; luzir e perfumarias em queda; recordo e comunhão com o imponderável.
Destarte, adiante da curvatura d’olhar, meras realidades fremem copuladas –  tempestivamente   em imagens consanguíneas:  volância  esplendida no encontro do si-mesmo com a poesia que delas irradia. Assim, não é mais a imagem que se prende ao instante, mas a coisa que a antecede, pois – pela negação do próprio olho – consente-se capturar.  No movimento, o pulso do sucesso supera a referencialidade do estar, e  dela fisga apenas o insinuado como ânima  de sensações e vivência d’eternidade que – súbito –  ali volve corpo.
Por isso, talvez, o trabalho de captura ultrapasse o mero ato de registro. É vida a  engendrar; ao capturar-se ­– de dentro de si – a aura do acontecimento. Sugere-se  salutar: a coisa ali, à espera de algo que não está. O olho lá, desenraizado da emoção circundante. Juntos, processam a transformação de mero registro para singularização de movimentos por jogos que, apenas em aparência, fixam determinada paisagem. Deste modo, todo e qualquer estado-de-estar se desilude, e a reconciliação resultante se vê diante de construção daquilo que a referencialidade arruinou: o sentido em vitalizar  e conferir humanidade para as coisas-em-si.
Tempestades e florações.
Então nos dispomos a observá-las, as fotos. E percorremos que – por mais lonjuras –  falam de coisas e falam de nós, e de outros que são outros nós; velhas terras e minguadas rotinas; estradas e recordações de familiaridades: encantos e desencantos diante dos olhos.
Sobressaltados, entramos em mundos e deles vertemos  sentido para o nosso. Tocamos com os dedos o que restou de reminiscências encolhidas e perdições aquiescidas. Sons, texturas, tonalidades ganham pulso na vida da imagem que à nossa frente – alhures – se precipita. Uma foto, destituída de senões, migra – assim – para “esta foto” e dela, simplesmente, para “a foto”, pois – em estado de emergência receptiva – vitaliza-se em  suspensão de nossa própria vivência-de-coisa que aquela “uma foto” suscitou, no imediato. Aí, pela visão do outro, – de invés – capturamos nosso próprio olhar introverso e, com tamanha maquinaria, fotografamo-nos:  a poesia verte-se em imagem e invade o espírito da gente e comunga com o silêncio que estronda em nossas mais íntimas anunciações.
Então, caminhamos.

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